Carência dos Benefícios por Incapacidade e Medidas Provisórias. Um tributo à instabilidade.
*Por Carolina Hofmann Vareli
Em casos de relevância e urgência, o art. 62 de nossa Carta Magna permite ao Presidente da República que edite medidas provisórias, com força de lei. Esse instrumento foi amplamente utilizado para alterar a legislação previdenciária nos últimos 03 (três) anos.
Sem entrar no mérito da constitucionalidade ou não das medidas provisórias, o fato é: a carência para concessão de benefício por incapacidade foi alterada e o dia em que você ficou incapaz para o trabalho pode (sim) fazer a diferença entre receber ou não o benefício.
A Lei de Benefícios (Lei n. 8.213/91) prevê uma carência de 12 (doze) meses para a concessão de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, mas ninguém escolhe ficar doente e incapacitado, ninguém escolhe precisar de uma cirurgia e ficar 90 (noventa) ou mesmo 180 (cento e oitenta) dias sem trabalhar – é obra do acaso! Não é possível programar: vou contribuir esse ano de janeiro a dezembro e ficar doente apenas em janeiro do ano que vem.
Pensando nisso e entendendo a dificuldade por que passam os contribuintes individuais e facultativos, que nem sempre tem uma renda fixa para contribuir mensalmente, e alguns empregados, que tem vínculos intermitentes e muitas vezes não tem sua carteira de trabalho assinada, a legislação trouxe uma previsão diferenciada.
No caso de o segurado adoecer, bastaria 1/3 (um terço) da carência para resgatar contribuições antigas e conseguir o benefício. Isso significa que se o trabalhador ficasse incapaz mas só tivesse 04 (quatro) contribuições naquele momento, poderia somar essas contribuições com outras anteriores, oriundas de qualquer tipo de vínculo (empregado, contribuinte individual, facultativo, etc.). Tendo 08 (oito) contribuições antigas sem um intervalo longo entre elas, o benefício seria concedido.
A redação citada esteve em vigor até 07/07/2016, um dia antes da publicação da Medida Provisória (MP) n. 739/2016, editada pelo então Presidente Michel Temer. O texto da MP revogou o parágrafo único do art. 24 da Lei n. 8.213/91 e, a partir daquela data, era necessário contar com as 12 (doze) contribuições no momento da incapacidade, sem qualquer possibilidade de resgatar outros recolhimentos. A MP não foi convertida em lei, mas manteve vigência até 04/11/2016. Encerrado o prazo, o parágrafo revogado com previsão de carência parcial voltou a valer.
Em uma nova tentativa de alterar o texto legal, no dia 06/01/2017 foi publicada a MP n. 767/2017, também editada pelo Presidente Michel Temer, que novamente revogou o parágrafo único do art. 24. Exige-se novamente os 12 (doze) meses de contribuição. Dessa vez, a medida provisória foi convertida na Lei n. 13.457/2017, mas com alterações.
Após discussões e ponderações, o poder legislativo aumentou o prazo previsto na redação antiga, revogando o parágrafo único do art. 24, mas incluindo no art. 27-A a necessidade de o trabalhador contar com ao menos metade da carência exigida (6 meses) para ter direito a resgatar contribuições anteriores e receber o benefício por incapacidade.
A MP n. 737/2017 se manteve em vigência entre 06/01/2017 e 26/06/2017, quando publicada a Lei n. 13.457/2017. Como a conversão da MP em lei foi extensamente discutida, ela criou a expectativa de – finalmente – ter se estabelecido uma regra definitiva, mas não foi dessa vez!
Ainda em seu primeiro mês de mandato, no dia 18/01/2019, o atual Presidente Jair Messias Bolsonaro editou a MP n. 871/2019, alterando o art. 27-A para exigir o tempo de carência integral. Novamente, são essenciais os 12 (doze) meses de contribuição!
Essa salada de frutas parece inofensiva, mas pode fazer a diferença entre o trabalhador receber o benefício ou não.
Supondo que um trabalhador tenha realizado uma cirurgia no joelho em 27/01/2019, recebendo atestado médico para permanecer afastado das atividades habituais por 90 (noventa) dias. Esse trabalhador conta com um acervo previdenciário de 9 (nove) anos de contribuição, entretanto, saiu do último emprego há pouco mais de um ano. Após um período de dificuldades financeiras, passou a efetuar recolhimentos como segurado facultativo, de modo que, na data da cirurgia, contava com 10 (dez) contribuições. Realizada a perícia médica, o perito do INSS reconheceu sua incapacidade desde a data da cirurgia, por todo o período pós-operatório.
Esse trabalhador tem direito ao benefício por incapacidade? Vê-se que ele não se filiou ao Regime Geral de Previdência Social apenas com o objetivo de receber esse benefício. Há um longo histórico laboral como filiado obrigatório. Entretanto, por ter duas contribuições aquém do necessário naquele momento, ele não terá direito à benesse.
Se esse mesmo trabalhador tivesse feito sua cirurgia 10 (dez) dias antes, em 17/01/2019, antes da vigência da MP n. 871/2019, poderia resgatar as contribuições vertidas em sua filiação anterior como empregado, tendo direito ao benefício de auxílio-doença por todo o período recomendado por seu médico assistente.
A carência em benefícios por incapacidade é um assunto um tanto complicado, envolvendo o cálculo do período de graça (previsto no art. 15 da Lei n. 8.213/91), toda a legislação vigente em cada período e análise da documentação médica que comprova a incapacidade.
Dessa forma, se você está com dúvidas ou teve problema com a carência na concessão de seu benefício, procure um advogado de sua confiança.
Francisco Beltrão 09 de maio de 2019.
Carolina Hofmann Vareli
OAB/PR 97.334